Anarquismo e Socialização

Seres humanos são constituídos – e de forma alguma eu penso que isso é algo ruim, claro – para serem requintadamente bons em negociações de cenários de custo/benefício. Essa habilidade é fundamental para todas as formas orgânicas de vida, aquelas que são mal sucedidas em calcular esse cenário são rapidamente excluídas do conjunto de genes – mas humanos possuem essa habilidade em um estupidamente brilhante nível conceitual.

Se você chegou até aqui neste livro, posso dizer pelo menos uma coisa sobre você. Obviamente você é uma mente curiosa e aberta e largamente não se ofende por argumentos originais, tão longe eles rivalizam pela racionalidade. Eu firmemente duvido que você esteja na academia – ou, se você está, eu suponho que prolixos, obtusos e condescendentes ataques aos meus argumentos apareçam na minha caixa de entrada, ou no seu blog, em algumas horas.

Potencial acadêmicos têm sido, em minha experiência, irremediavelmente hostis àquilo que eu faço porque os coloca em uma requintada e tortuosa posição (esse é, em particular, o caso com o meu livro “Universal Preferable Behavior: A Rational Proof of Secular Ethics”).

Acadêmicos wannabe devem acreditar que eles são motivados pela procura da verdade, não do título. Dado que eles têm de congraçar-se com seus mestres acadêmicos, eles devem ainda acreditar que seus professores são motivados pela busca da verdade também, não pelo poder, pelo dinheiro e pelo título. Nós podemos honrosamente submeter-nos a um professor amoral.

Se acadêmicos estão pela busca da verdade, então minha particular contribuição para o campo devia ser, no mínimo, angariar algum interesse, se apenas pelo sucesso atingi leigos. Contudo, um wannabe graduando irá enfrentar ansiedade até mesmo no pensamento de trazer algum de meus trabalhos aos seus professores, ele será minado do consecutivo progresso em sua carreira acadêmica.

Portanto o que faço é tortuoso, particularmente para os estudantes de graduação, porque isso revela a eles a básica realidade da academia, que não é amplamente a busca da verdade, mas antes sobre o arranjo de influência e benefício e a busca de objetivos de carreira – inevitavelmente, à custa da própria verdade.

Quando isso é revelado, o longo trecho enfadonho de meia década ou mais exigido para perseguir e atingir um Ph.D. torna-se um deserto que verdadeiramente parece muito largo para cruzar. A ansiedade e o desespero que meu trabalho evoca criam medo e hostilidade – e é muito fácil tirar isso de mim para questionar ou criticar o sistema acadêmico ou os professores que aprovam esses heróis morais de que dependem.

Além disso, questionar o teto moral do sistema em que eles estão inseridos iria simplesmente ejetá-los desse sistema (como a teoria anarquista iria predizer) e iria de forma alguma reformar o sistema ou mudar a mente de alguém sobre isso, ou aprimorar as qualidades do ensino. Então aqueles que reclamam serão inevitavelmente falar a si mesmos a confortante mentira de que o sistema é falho, reconhecido, mas deixá-lo seria abandonar um posto, então de falar e a prática e moral coisa a fazer é lutar através e aprimorar a qualidade do ensino como melhor puder para o futuro.

É claro que isso tudo é completamente impossível, mas uma tentadora mitologia que ajuda o sono de um graduando comum para dormir à noite.

A razão pela qual estou falando sobre esse tipo de cálculos é porque nós enfrentamos essa escolha na vida quando somos apresentados com um argumento surpreendente e imprevisto que não podemos desmantelar. Nossa verdadeiramente brilhante habilidade de processar cenários de custo/benefício imediatamente chuta uma série de silogismos como os seguintes:

  • Argumentos anarquistas são válidos MAS...
  • Eu nunca terei nenhuma influência na eliminação do Estado no meu tempo de vida;
  • Eu irei alienar, frustrar e desorientar aqueles a minha volta apresentando esses argumentos;
  • Eu nunca terei influência alguma sobre o pensamentos das pessoas a minha volta;
  • Se as pessoas têm de escolher entre a verdade que trago e suas próprias ilusões, eles irão abandonar a verdade e a mim sem nem olhar para trás.
  • Portanto, eu vou alienar em mesmo em mim, por uma questão de um objetivo que nunca irei atingir.

Esse tipo de cálculo lampeja rapidamente em nossas mentes, resultando em irritação em relação aos argumentos que nunca podem ser diretamente expressos e medo de qualquer investigação maior da verdade das relações sociais e profissionais.

A sociedade realmente é um ecossistema de premissas ou argumentos acordados, usualmente baseados na tradição. Aqueles que aceitam a “verdade” desses argumentos encontram seu curso prático pela existência facilitada da estrutura social; eles não perguntam às pessoas o que elas realmente pensam, eles não desconfortam os outros com verdades desconfortáveis e, portanto, o que passa para o discurso no mundo assemelha-se mais a dois espelhos frente a frente – uma limitada infinidade de reflexão vazia, se você perdoar a metáfora.

Quando uma nova ideia tenta adentrar a corrente sanguínea intelectual da sociedade, por assim dizer, aqueles que fizeram suas apostas na continuidade da crença existente reagem como qualquer sistema biológico de defesa iria reagir, uma combinação de ataque e isolamento.

Quando você pega uma infecção, seu sistema imunológico primeiro tentará eliminar a bactéria; se isso não é possível de ser feito, o sistema tentará isolá-la formando uma casca ou cisto em volta da infecção.

De forma similar, quando uma nova ideia “infecta” o existente ecossistema do pensamento social, os intelectuais primeiro tentarão ignorá-la, mas então tentarão “eliminá-la” usando uma variedade manipulava de truques emocionais, como desdém, virar os olhos, risos cínicos, agressão, insultos, condescendência, ataques ad hominem, etc.

Se essas táticas agressivas não funcionarem por alguma razão, então a posição de resguarda é uma rígida tentativa de “isolar” aqueles que apoiam o novo paradigma.

Essas táticas são tão estupidamente efetivas que centenas ou milhares de anos podem passar entre significantes novos movimentos e realizações intelectuais. O último grande salto para a frente no pensamento ocidental, isso pode ser argumentado, ocorreu em meados do tempo do iluminismo, algumas centenas de anos atrás, quando novas ideias de livre mercado e o poder e a validade do método científico emergiram. (“Democracia” e a “separação entre Estado e Igreja” não eram novos conceitos, mas heranças do interesse de expansão da jurisprudência romana que emergiu após o século XIV com o ressurgimento das cidades e a subsequente necessidade de mais compreensivas e detalhadas leis civis.) Desde então, houveram dramáticos aumentos nas liberdades pessoais – notavelmente, a abolição da escravatura e a expansão dos direitos de propriedade para as mulheres, mas no século XX, muitos dos “novos” desenvolvimentos no pensamento humano tenderam para retrocessos tribais, teorias irracionais e más na prática, como o fascismo, o comunismo, o socialismo, o coletivismo, etc.

A sociedade “sobrevive” aceitando um conjunto bastante rígido de axiomas. Se as pessoas começarem a criticar esses axiomas, elas são primeiro ignoradas, depois atacadas e então isoladas. Indivíduos quase não têm capacidade para derrubar o âmago desses axiomas em suas próprias vidas – e, portanto, é necessária alguma dedicação “irracional” à verdade e à razão para esse curso.

Isso é mais uma coisa que sei sobre você...

Sócrates descreveu a si mesmo como uma “mosca” que zunia em volta da sociedade importunando-a através de seu persistente questionamento – mas ele em si mesmo era incomodado por uma “mosca” interna que constantemente resmungava a ele os mesmos problemas.

Dado o extraordinariamente alto diploma do desconforto que é gerado por questionar os axiomas sociais, eu tenho certeza de que você também está possesso por um desses “demônios socráticos” internos que não lhe deixarão inerte perante a irracionalidade, ou permanecer contente com pseudo-respostas para questões essenciais.

Agora que eu abri pelo menos a possibilidade de tais questões aparecerem em sua mente, eu sei que você se manterá retornando a elas, quase involuntariamente, revirando-as, em busca de fragilidade – por causa de um tipo de obsessão que você tem, ou mania, de consistência com razão e evidência.

Há pouquíssimos de nós que, em um cenário ralwsiano, se curvariam diante do aparecimento e exigiriam a concessão desse tipo de dedicação obsessiva compulsiva à verdade filosófica. Devido a esse grau de inconveniência social, os resultantes ansiedade, hostilidade e isolamento, e a quase certeza de que não viveremos para ver a verdade que conhecemos aceita amplamente, mostra-se quase um masoquismo retomar os argumentos que todos aceitam como provado e moral. Nós podemos também ser detetives policiais questionando um caso com 200 testemunhas, uma confissão e uma arma fumegante. Assim como esse detetive seria visto como aborrecedor, irracional e estranho...

Bem, estou certo de que você captou a imagem, porque você vive nessa imagem.

Portanto, em tentativa de responder a questão de porque essas ideias, embora racional e relativamente simples de entender, permanece não mencionada e não examinada, podemos ver que qualquer cálculo puramente prático dos custos e benefícios de trazer esses assuntos à tona, seja em meio acadêmico ou em meio ao círculo social de alguém, conduziria qualquer pessoa racional a evitar esses pensamentos pela mesma razão que nos faria dar a uma sibilante cobra um amplo espaço.

É claro que a razão da sociedade progredir é porque todo homem e mulher pensantes pagam pelo menos um superficial serviço labial aos princípios da razão e da evidência.

A corrupção e falsificação do discurso social que inevitavelmente resulta de um intelectualismo fundado no Estado representa enormemente uma poderosa e aparentemente esmagadora “frente” que pode manter para sempre um exame racional de premissas centrais da abertura.

Infelizmente para os acadêmicos – embora felizmente para nós – o advento da Internet foi um passo para diminuir o isolamento, então aqueles de nós dedicados à “verdade a todo custo” não poderá nunca ser isolado da interação social, mesmo que estejamos satisfeitos com a pequena intimidade dos relacionamentos digitais.

Enquanto que no passado eu teria de tolerar uma distorção e fútil isolamento daqueles em minha volta, o que teria muito provavelmente destruído meus espírito e desejo pela “verdade a todo custo”, eu agora posso conversar livremente com pessoas de mentalidade semelhante a qualquer hora, dia ou noite.

O custo da “verdade a todo custo” tem portanto diminuído consideravelmente, fazendo com que a busca fique mais atrativa.