A anarquia e a educação
Se os pobres carecem de sabedoria, conhecimento e bom julgamento, mas foram educados pelo governo por quase 15 anos seguidos, então certamente nós acreditamos que eles podem ser educados, mas devemos culpar o governo pelo fracasso em educá- los. Uma vez que os pobres não podem pagar escolas particulares, eles devem entregar seus filhos a escolas governamentais, que têm o monopólio completo e coercitivo sobre sua educação.
Agora, ou os pobres têm a capacidade de ser sábios e inteligentes, ou não têm. Se os pobres têm a capacidade de possuir sabedoria, então o governo é plenamente culpado pelo fracasso de cultivá-la através da educação. Se os pobres não têm capacidade de ser sábios, então o governo é plenamente culpado por desperdiçar enormes recursos numa tentativa fútil de educá-los – e, além disso, eles também não podem ter o direito de votar.
Novamente, embora eu saiba que isso é desconfortável ou irritante de ler, estou resistindo em dar as respostas anarquistas claras e morais para esses problemas aparentemente intratáveis. Se seu apêndice estiver inflamado e eu me oferecer para removê-lo, você certamente vai ficar grato; se eu, por outro lado, me oferecer, na rua, para remover algum órgão seu que você creia ser necessário e saudável, você certamente se veria bem inclinado a me acusar de agressão.
Dado que o anarquismo representa uma ruptura quase completa com a sociedade política – embora, como descrito anteriormente, uma expansão altamente moral e racional da sociedade pessoal -, ele permanece pouco atrativo se nada de errado houver em particular na sociedade política.
Churchill certa vez observou que "a democracia é a pior forma de governo, excetuando-se todas as outra que já foram tentadas". Os anarquistas acreditam que isso sejam verdade, mas acrescentam que nenhuma forma de governo é melhor que governo algum!
Isso não significa dizer que a democracia não é uma forma melhor de governo que a tirania. Certamente é – meu problema é que nós no Ocidente alcançamos a democracia nos últimos séculos e agora parecemos estar eternamente satisfeitos com nossas glórias, por assim dizer.
Eu passei quase 15 anos como empresário no ramo de software, o que pode ter enviesado minha perspectiva sobre a questão em certo grau. A área de software se reinventa quase que inteiramente a cada ano ou dois, aparentemente, o que exige constante comprometimento ao dinamismo, aprendizado contínuo e o abandono de preconcepções. As rápidas marés da mudança perpétua rapidamente varrem os inertes.
Por isso eu aprecio totalmente o significativo passo adiante representado pela democracia – mas o fato de que algo seja "melhor" não indica que ele é "o melhor".
Quando os cirurgiões medievais perceberam que um paciente tinha melhores chances de sobreviver à gangrena se arrancasse seu membro doente, essa certamente era uma solução melhor – mas dificilmente poderia ser chamada de a melhor solução possível. Reconhecer que a prevenção é sempre melhor que a cura não significa que todas as curas sejam igualmente boas.
Não tenho qualquer dúvida de que o primeiro homem das cavernas a descobrir como começar um fogo dividiu seu conhecimento com sua tribo e que todos da tribo sentaram numa caverna, com seus pés apontados para as chamas ardentes, aquecidos no meio do frio inverno pela primeira vez, e rosnaram uns para os outros: "Bom, não dá para ficar melhor do que isso!"
Sem dúvidas, quando, um milênio depois, alguém percebeu que era mais fácil capturar e domesticar uma vaca do que caçá-las continuamente, todo mundo sentou em volta do fogo, com seus estômagos cheios de leite e disseram uns para os outros: "Bom, não dá para ficar melhor do que isso!"
Essas coisas são melhorias genuínas, para ser claro, e não devemos jamais deixar de apreciar o progresso que fazemos – mas também não devemos automaticamente e interminavelmente presumir que todos os passos à frente que dermos são os finais e mais perfeitos, e que nada jamais pode ser melhorado no futuro.
A democracia é considerada melhor que a tirania – corretamente, eu acredito – porque, em algum grau, ela imita os mecanismos de resposta do livre mercado. Os políticos, diz-se, devem prover bens e serviços aos cidadãos, que respondem através das eleições.
Pareceria lógico continuar a estender mais e mais aquilo que faz com que a democracia funcione. Se eu, como médico, percebo que infecto menos de meus pacientes quando lavo meu dedo mindinho, faria sentido começar a lavar outras partes de minha mão também.
De fato, é disso que se trata a minha abordagem ao anarquismo. Se o voluntarismo e os mecanismos de resposta – um semi-mercado – são o que torna a democracia superior, então certamente devemos trabalhar o tanto quanto possível para estender esse voluntarismo e esses mecanismos de resposta – em particular porque nós temos exemplos de mercados verdadeiros, que funcionam espetacularmente bem.